sexta-feira, 3 de agosto de 2012

“Como articular a função social da escola com as especificidades e as demandas da comunidade?”

Especialmente neste século a todo o momento estamos a questionar qual a real função social da escola? Muitos estudiosos já afirmaram que ninguém ensina ninguém, há uma troca de experiências, de visão, de cultura, os saberes intrínsecos ao ser humano são compartilhados. Na época do império, incluindo D. João VI, D. Pedro I e D. Pedro II, pouco se fez pela educação brasileira, para as classes populares, e a qualidade era tida como boa. Com a Proclamação da República tentou-se várias reformas que pudessem dar oportunidade ao povo para adentrar na roda da troca de saberes, escola. A educação brasileira não sofreu um processo de evolução que pudesse ser considerado marcante ou significativo em termos de modelo e, principalmente de inclusão.

A relação social entre a escola e a comunidade remanescente de quilombo Barro Preto, a divulgação e efetivação das ações afirmativas, a negação do saber popular traz para a escola uma responsabilidade e uma função social muito mais delicada, emaranhada, idealizada e com a função da efetivação de fato.



O termo quilombo era usado para caracterizar a habitação de negros fugidos do sistema escravista. Entretanto, esse termo encobre variados contextos de resistência de africanos e afrodescendentes na formação e defesa de sua cultura e do legado dos antepassados. O termo remanescente de quilombo não se refere a resíduos ou resquícios arqueológicos de ocupação temporal ou de comprovação biológica. Também não se trata de grupos isolados ou de uma população estritamente homogênea. Da mesma forma nem sempre foram constituídos a partir de movimentos insurrecionais ou rebelados. No nosso caso a comunidade nasceu da necessidade do escoamento da produção industrial, na qual Jequié devido a sua localização geográfica foi escolhida para dar passagem a estrada de ferro que teve como mão de obra o negro semi escravizado. Aqui desenvolveram práticas cotidianas de resistência na manutenção e reprodução de seus modos de vida característicos. O Decreto nº 7.031-A de 1878 permitia aos negros o estudo, mas somente no período noturno. A partir da mobilização do Movimento Negro e da organização das próprias comunidades conseguimos avanços garantindo-lhes o direito à identidade e à perpetuidade cultural. O cidadão negro precisa da escola como essa precisa dele para promoção e preparo da cidadania em seu pleno gozo. Garantir a educação de qualidade respeitando sua história e suas práticas culturais é pressuposto fundamental para uma escola preocupada com o fazer e a transformação social.



A implementação da Lei 10.639/2003 não se restringe ao espaço escolar das comunidades quilombolas, todavia, os esforços para a garantia de uma educação que contemple as particularidades étnicas, culturais e políticas dessas comunidades é uma das formas de cumprimento da lei. O conhecimento popular precisar adentrar na escola e o conhecimento sistematizado sair dos muros escolares e adentrar nas casas dos estudantes transformando de fato a trajetória do ser negro na sociedade atual.



Nos encontros entre docentes, funcionários, discentes, família e gestores são verificáveis a falta de sentimento de pertença a sua etnia, ao bem público, ao acompanhamento da educação e seus reflexos dentro da evolução da comunidade e no seio da família negra. Percebemos o longo caminho a percorrer, tanto no sentido de romper o silêncio e a invisibilidade histórica que acompanham a trajetória dessas comunidades, como de se reconhecer como agente transformado de seu mocambo, do seu meio.



Até 2007 o Colégio Duque de Caxias não teve a preocupação de entender o caminhar dos docentes, discentes, funcionários e gestores. Cada grupo escolhia o seu caminho levando em consideração as necessidades individuais. Em 2008 nasce o desejo de uma educação tendo como base o coletivo, o comum, a estruturação, acompanhamento e avaliação da comunidade escolar visando o diferencial no dia a dia da comunidade.



Num momento inicial docentes, discentes, gestoras e comunidades se questionaram: Escola quilombola, Educação Quilombola? Essa confusão foi um marco importante para a história da nossa educação dentro do nosso quilombo urbano. Pela primeira vez, estávamos sendo ouvidos em um grande espaço político e institucional. É preciso ressaltar que essas participações em plenárias públicas e as conquistas advindas das discussões não se deram de uma forma harmoniosa, tampouco sem a pressão e luta do movimento social negro organizado, ODEERE (Orgão de Relações Étnico-Raciais), Mocambo Odara, Secretaria da Educação do Município, com a Professora Graça Bispo... As demandas levantadas eram alvos de polêmicas e questionadas por alguns setores da sociedade local.



Para que pudéssemos construir uma política pedagógica que refletisse a dinâmica cultural da comunidade, foram realizadas formações continuadas por meio de cursos, encontros, oficinas, fóruns e seminários, envolvendo docentes, gestoras e pessoal de apoio, discentes, com a participação de militantes do movimento negro, além de acadêmicos/as. A formação continuada possibilita a sensibilização dos profissionais.



Paralelamente à formação continuada da equipe, iniciou-se o diagnóstico educacional, pedagógico, institucional e sues reflexos na comunidade e suas especificidades. Esta atividade contou com a participação acadêmica da UESB e UNEB, a Coordenação da Diversidade-SEC, através da Coordenadora Nádia Cardoso e DIREC 13, na pessoa do Professor Roberto Gondim. Seu principal objetivo foi identificar a relação da escola e da comunidade na formação do cidadão democrático. Os docentes passaram por um processo de indagação, de revisão do ser ou não ser racista e seus derivados, além da sensibilização para uma nova prática pedagógica, visando a comunidade quilombola, do entrono da escola.



Citamos as falas que denotavam um sentimento de pertença e comunidade distorcidas, pragmáticas, embutidas e incutidas por um determinado grupo social. Estudantes negros/as lutam por uma real democracia. A procura de escolaridade e empregos de qualificação. Engrenamos na busca. Não sabemos o caminho, mas temos certeza de onde queremos chegar.

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